sexta-feira, 14 de agosto de 2015


De tanto procurar felicidade em ter,

Deixam de ser,

De viver de verdade,

De amar de verdade,

Deixam para ter,

Deixam de ser,Deixam, não vivem, deixam de Ser...

(Márcio Reis)




Sem querer te conto tudo,
sem querer me faço transparecer,
sem querer amor,
sem querer sinto,
sem querer já quero,
amo, sinto, sempre muito,você...(Márcio Reis)











"Quem ama sente,
sonha,
voa livre,
quem ama,
sente até mesmo a dor
que o outro sente,
sente amor,
quem ama
sonha,
acorda e sonha,
com a vitória do amor...
(Márcio Reis)

MORRER DE AMOR É O QUE MAIS SE PARECE COM VIVER PARA SEMPRE

Morrer de amor é o que mais se parece com viver para sempre

Aqui deste canto suspenso do mundo, bicho triste, enxerido e só, saio à janela e escapo um instante de tanto dever doméstico, a louça, a roupa, o lixo, as contas, e espio um casal lá embaixo. Um belo e simples casal feliz na manhã de seu amor, sentado no banco morno do jardim apanhando sol.
Certo é que o “belo e simples casal feliz” é por minha conta, mera expressão de minha boa vontade. Porque eu sequer os conheço, não enxergo seus rostos daqui e tampouco sei se o romance anda no começo, no meio ou no fim. Portanto, não sei se são belos, simples e felizes. Mas passa aqui dentro uma emoção estranha e um desejo louco de sabê-los assim.
Sua conversa mansa, os gestos calmos, o riso franco, o recato elegante das mãos ora dadas, ora postas sobre o joelho do outro, ora desenhando círculos no ar, ora investidas em carinhos na face alheia, tudo isso parece coisa de namoro novo, encabulado, tateando o chão ao redor depois do tombo no escuro. Mas bem podia ser o remanso de quem por sorte e por empenho superou a tormenta da paixão, a fogueira barulhenta do entusiasmo primeiro, a agitação mental perturbadora. E agora vive a paz que vem depois da intempérie.
Seja quem for esse casal, novo ou velho, no início, no meio ou no fim, eu torço por eles. Que não lhes falte amor, dinheiro, assunto. E se faltar, que encontrem juntos ou não o caminho de cada um.
Mal sabem eles, mas seu namoro no banco cumpre agora uma adorável e grandiosa missão. Seu amor puro e simples trouxe a este canto suspenso do mundo uma esperança vaga e um sonho insano. Agora salto com eles rumo a terras distantes, viagens eternas, domingos à tarde, sol quente e brisa morna ventando saudade. Sigo em sua companhia. Essa gente que ama para viver, ama porque deseja ficar viva. E porque morrer de amor é o que mais se parece com viver para sempre.
Então vamos, casal amigo, povoar o mundo de boas lembranças. Vamos que é tempo de reunir os outros, fazer grupos, desorganizar a ordem das coisas. Vamos a Brasília criar o Ministério do Amor! E entre as velhas pastas da educação e da cultura, da saúde e do bem-estar social, teremos uma nova agenda de investimentos amorosos!
A partir desse dia, a prerrogativa única de toda decisão será forte, franca e irrevogável: “faça-se tudo com amor ou não se faça nada!” É isso! Nós acertamos!
Aos poucos, o crime nas ruas vai desaparecer por pura falência de intenções criminosas, as brigas no trânsito se extinguirão em seguidos surtos de civilidade, as guerras fracassarão dos dois lados por avalanches de deserção militar, a tolerância, a compreensão e o respeito jorrarão pelas ruas em caminhões pipa e a vida será muito mais simples e cheia de amor. Tudo isso porque tem um casal ali embaixo, amando seu amor simples e… partindo de repente, sabe-se lá para onde. Esperem, amigos! Eu ainda nem comecei!
Mas eles se foram. Eles se foram, sim.
Até já, belo e simples casal feliz. Guardo comigo o nosso sonho. Porque aqui neste canto suspenso do mundo vive ainda uma esperança boa. Eu ainda tenho esperança na vida. Ela continua ali, me esperando com a louça, a roupa, o lixo e as contas. Bem ali.

PARA AS ALMAS AMOROSAS, QUALQUER LUGAR LONGE DO SER AMADO É TERRA ESTRANGEIRA

Não olhe agora. Mas nós estamos cercados de estrangeiros. O mundo, esse lugar tão grande quanto a sala da nossa casa, anda povoado de forasteiros. É gente nascida em todo canto, rumando para todo lado, mas que em algum instante, de alguma sorte, seguiu para longe de seu amor. Uns há horas, outros há dias, semanas, meses, anos, todos se encontram distantes do ser amado.
O jeito não engana. Essa gente enamorada de alguém que vai longe tem um jeito aplicado de trabalhar direito, como quem quer logo voltar para casa. Tem distância geográfica, lonjura do coração ou os dois. Não importa. Tudo é longe para quem não caminha junto de seu amor.
Alguns sequer o encontraram. Outros o acharam e o deixaram partir. Há os que têm saudade simplesmente porque não podem estar o tempo todo agarrados a seu bem. Todos são andarilhos em terra estrangeira, vagando em busca de amor. As almas enamoradas são assim. Longe a qualquer distância de quem amam, sentem no coração um banzo, uma saudade, um não-sei-quê de nostalgia.
Assim como os imigrantes que partem para um país distante, levando escondidos na bagagem um saquinho do feijão de sua terra, um punhado do café de sua cidade, uma muda do hortelã dos avós para o chá das noites de insônia e tristeza, há também os que só resistem à saudade porque carregam consigo lembranças de seus dias de amor e de paz.
Não há remédio que dê jeito na falta do amor distante. Nada senão rumar para onde o coração ficou cativo. Depois seguir de alma leve, remoçada. Almas enamoradas funcionam assim. Se vão, carecem de voltar. Para elas, qualquer lugar fora de seu amor é terra estrangeira. Do outro lado do mundo ou ali na esquina.
Eu entendo as almas enamoradas de todo canto. Eu aqui, em minha solidão de bicho, compreendo sua disposição para a vida, sua lida convicta de honestos trabalhadores, seu jeito firme e manso que só têm as pessoas boas. Entendo, respeito, admiro e agradeço.
Porque as almas enamoradas, mesmo aquelas que caminham sós em busca do amor que talvez nunca venha, carregam e levam adiante nossa primeira e maior vocação: a de dar e receber amor por aí.
Em sua labuta, as almas enamoradas assumiram a tarefa de entregar, umas às outras e a quem mais estiver perto, palavras de tão profundo carinho, embrulhadas em gestos tão simples, que desarmariam as caras mais feias e desmontariam as intenções mais odiosas.
A cada novo encontro amoroso, conspiram os enamorados por um mundo de pessoas livres, ativas e gentis. Gente que acredita no trabalho e pratica seu ofício com honestidade e gratidão. Almas que valorizam o tempo e não o perdem com besteira. Que apontam o barco para a frente e não o dedo a ninguém. Que ouvem o que lhes dizem, guardam o que desejam e respondem o que precisam. Criaturas imperfeitas que vivem sua vida e deixam em paz a dos outros. Que preferem a crença no esforço próprio e dispensam a crítica ao empenho alheio.
Assim são as almas enamoradas. Boas quando longe de seu amor. Melhores ainda quando perto. Para elas, qualquer lugar fora de seu amor é uma fria, distante e aborrecida terra estrangeira.